BACAMARTE: Minha senhora case-se comigo e assim seremos felizes para sempre...
EVARISTA: Você encantou-me com essas palavras doces. Mas como posso aceitar? O que as pessoas vão dizer?
BACAMARTE: Se é medo o que sentes, serás feliz ao meu lado... (E a roda com alegria)
EVARISTA: Quando marcamos o casamento?
BACAMARTE:
Amores derretidos,
Pessoas tão amadas,
Esquecem suas vidas
Para então viver casadas.
O amor ilumina
A terra gira,
O corpo treme,
E tudo rima.
O que fazer se não tentarmos ser felizes?
Penso em você,
Penso no amor,
Penso em nossa vida.
Eu penso!
EVARISTA: Você conseguiu mexer com o meu coração!
BACAMARTE: Daqui a dois dias nós nos casamos. O que você acha?
EVARISTA: Está bem...
BACAMARTE: (Ele abre a porta e diz): Adeus minha futura esposa... (Sua tia está na porta bem na hora em que Evarista e Bacamarte se despedem).
TIA: Simão Bacamarte, Dona Evarista reúne condições fisiológicas e anatômicas de primeira ordem. Dorme regularmente, tem bom pulso e excelente vista. Está apta para dar-lhe filhos robustos, sãos e inteligentes, mas...
BACAMARTE: (interrompe) Não diga nada minha tia. Estou certo que ela será a melhor esposa...
TIA: Mas ela é muito feia!
BACAMARTE: Também estou certo de que os homens não olharão para ela.
TIA: Não diga mais nada, estou indo embora! (Ela sai muito irritada, porém mantém a compostura).
Bacamarte e Evarista se encontram no cartório para esperar o padre celebrar a missa.
PADRE: Estamos aqui para celebrar a união entre duas pessoas que se amam, a fim de curtir a vida, juntar os trapos, botar algema (apontando para o dedo). Sacou?
Dona Evarista Soares Filho, aceita a mão de Simão Bacamarte Poldina em casamento? Prometendo amá-lo, respeitá-lo, na riqueza e na pobreza, na saúde e na doença, na traição e no perdão... Até que a morte vos separe?
EVARISTA: Sim, aceito.
PADRE: Doutor Simão Bacamarte Poldina, aceita a mão de Evarista Soares filho em casamento? Prometendo tudo aquilo que já disse?
BACAMARTE: Sim, eu aceito.
PADRE: Pode beijar a noiva.
Depois desta celebração eles vão para casa. Mas logo que chega e olha pela janela, vê duas garotas no banco da praça. Uma delas está interpretando o texto em voz alta...
GAROTA 1: (O povo no poder - de Castro Alves):
“A praça! A praça é do povo
Como o céu é do condor,
É o antro onde a liberdade
Cria águias em seu calor.
Senhor!... Pois quereis a praça?
Desgraçada a populaça
Só tem a rua de seu...
Ninguém vos rouba os castelos,
Tende palácios tão belos...
Deixes a terra ao Anteu.”
BACAMARTE: (Chama as garotas e pedem para entrar na sua casa) Entrem! (pausa) O que faz você ler uma poesia em voz alta?
GAROTA 1: Ah, é a alegria de viver, é a vida, é o cantar, é a felicidade, é tudo! Amor talvez.
BACAMARTE: Amor?
GAROTA 1: Sim, amor. Àquilo que faz você ser feliz, que faz você cantar, amar...
BACAMARTE: Esta felicidade traz algum benefício para sua vida?
GAROTA 1: Traz o prazer da felicidade.
BACAMARTE: Como você explica essa felicidade?
GAROTA 1: Não tem explicação!
BACAMARTE: Mas tudo tem explicação.
GAROTA 1: (Muda a expressão de rosto e diz): Não sei explicar.
BACAMARTE: Então você ficará aqui.
GAROTA 1: Como assim, ficarei aqui?
GAROTA 2: Ei, e eu?
BACAMARTE: Ficarão as duas aqui!
GAROTA 1: Você está brincando, não é?
BACAMARTE: Você não sabe explicar o que está causando sua felicidade, isso é loucura. Você sofre de demência.
GAROTA 1: Demência? Como você explica que minha felicidade é demência?
BACAMARTE: Você não tem direito de ficar na sociedade
GAROTA 2: Direito você não tem é de trancar nós duas aqui.
BACAMARTE: Tenho sim.
GAROTA 1: Como?
BACAMARTE: Você verá! (Tranca-as num lugar onde a platéia não pode ver e vai à prefeitura. Bate na porta da prefeitura e fala do lado de fora): Gostaria de falar com o prefeito!
PREFEITA: Espera um minutinho! (a porta se abre)
BACAMARTE: Seu prefeito, espera aí, prefeita?
PREFEITA: As pessoas se surpreendem quando vêem uma prefeita e não um prefeito.
BACAMARTE: Quero dizer que sou Simão Bacamarte, um alienista que estuda as anormalidades alheias. Ando fazendo estudos muito críticos das pessoas.
PREFEITA: Mas qual seu objetivo?
BACAMARTE: Criar uma casa de Orates para estudar essa anormalidade com objetivo de ajudá-los. Estou fazendo tudo isso, mas peço autorização da senhora prefeita e então desenvolverei meus estudos.
PREFEITA: Se são esses seus objetivos, então autorizo, pois pode ajudar muita gente. Farei um documento autorizando... (escreve num papel e entrega para ele que sai meio enlouquecido)
BACAMARTE: (Chegando em casa ele fala com as garotas): Oi meninas?!
GAROTA 2: Por que estou aqui presa junto com ela?
BACAMARTE: Você acha normal ler um poema em voz alta no meio da rua?
GAROTA 2: Por que não seria?
BACAMARTE: Se você acha normal é porque sofre de alguma normalidade.
GAROTA 2: Anormalidade é você nos prender aqui sem direito!
BACAMARTE: Direito eu tenho, leia este documento. (Elas lêem, devolvem e saem. Logo vê sua esposa triste e pergunta): O que está acontecendo com você?
EVARISTA: Comigo nada! (Ela vai em direção do telefone e liga falando): Eu quero aquele vestido bonito, diferente, prendado...
A porta bate
BACAMARTE: (sua tia está acompanhada) Tia!
TIA: Oi meu sobrinho, este é Crispim Soares.
BACAMARTE: (Acha o cara estranho e afeminado) Muito prazer!
CRISPIM: Prazer! (aperto de mão)
BACAMARTE: O senhor é...?
CRISPIM: Eu pelo menos era...
BACAMARTE: Era o que?
CRISPIM: Trabalhava na câmara, era vereador.
BACAMARTE: E por que não é mais?
CRISPIM: Porque fui acusado de furto, mas eu juro que não fui eu, foi a prefeita. Agora luto para tomar o lugar dela.
BACAMARTE: E por que a prefeita faria isso?
CRISPIM: Ora, ninguém sabe... Mas não vamos falar sobre isso.
Bacamarte olha meio estranho devido ao rumo da conversa e sua mulher vai na direção da prosa. Quando chega ao recinto, Crispim levanta e fica cheio de sorrisos para ela. Bacamarte fica furioso.
CRISPIM: Oi bela senhora!
EVARISTA: Muito prazer! (Crispim beija a mão dela)
BACAMARTE: Você não ficará na sociedade, ficará aqui!
EVARISTA: Meu marido, o que é isso?
CRISPIM: Eu não sou louco!
BACAMARTE: Você não pode, aliás, não deve beijar a mão da mulher alheia.
CRISPIM: Mas isso demonstra respeito.
BACAMARTE: Minha tia, você acha correto este homem beijar a mão de minha mulher?
TIA: Mas isso é completamente normal Bacamarte!
BACAMARTE: (diz revoltado) Vou dar uma volta. (tranca todos em casa e vai para a praça).
HOMEM: (Aparece para questioná-lo) Eis que prendeste aquelas pessoas inocentes. Por quê?
BACAMARTE: Como inocentes? Eles não sabem o que causa a felicidade, isso é normal?
HOMEM: Então me diga: Você é feliz?
BACAMARTE: Não existe felicidade
HOMEM: Como não?
BACAMARTE: Felicidade é uma demência.
HOMEM: Demência? O senhor diz isso, pois nunca foi feliz e nunca será. Você acha que as pessoas são loucas, mas elas são felizes, e o senhor não pode ver a felicidade alheia. Isso lhe incomoda.
Bacamarte sai furioso, mas antes de chegar em sua casa, encontra a prefeita
PREFEITA: Estou aqui para dizer que quero acabar com esta história, não quero mais uma casa de Orates na cidade, aliás, de loucos.
BACAMARTE: A senhora está discordando de mim?
PREFEITA: E quem é a autoridade aqui?
BACAMARTE: Se você está discordando de mim, então eu vou...
PREFEITA: Vai o que?
BACAMARTE: (Abre a porta de casa) Vou lhe trancar aqui!
PREFEITA: Mas isso é inadmissível!
BACAMARTE: Esqueceu que assinou este documento? (tira ele do bolso)
PREFEITA: Eu sou a prefeita!
BACAMARTE: E eu sou a justiça! (sacudindo o documento que está em uma de suas mãos)
Nesse momento Evarista que por sua vez se encontra bem vestida vê a prefeita entrando.
EVARISTA: O que a prefeita está fazendo aqui?
BACAMARTE: O que você está fazendo assim?
EVARISTA: Assim como?
BACAMARTE: Desfrutável!
EVARISTA: Ser bonita é ser desfrutável?
BACAMARTE: Você está me desafiando?
EVARISTA: Longe de mim tal idéia!
BACAMARTE: Não quero você vestida assim!
EVARISTA: Não vou te obedecer, estou cansada de suas loucuras. Você prendeu meio mundo aqui em nossa casa e agora passou dos limites.
BACAMARTE: Você ficará presa aqui porque está sofrendo de demência, igual a todos eles.
EVARISTA: Mas você é meu marido!
Esse é um momento em que ele se encontra sozinho, atolado nos livros e desorientado. Houve gritos com o seguinte dizer: “Morra Doutor Bacamarte”.
É população indignada.
BACAMARTE: (Vai até a janela e diz): Direi pouco ou não falarei nada. O que pedem?
HOMEM: Queremos dar liberdade às vítimas do vosso ódio.
BACAMARTE: Esses rebeldes precisam ser tratados. (entra em casa e liberta todos). Saiam daqui, vão embora, sumam! (ele repete isso várias vezes de forma descontrolada).
Momento de pura tensão, ele fica sozinho. Evarista, com ele se derrama em lágrimas, e ele fica lamentando uma ação mal sucedida.
EVARISTA: (Levanta e enxuga as lágrimas) Vou embora com o Crispim, porque eu sei que a morte vai nos separar. Você que buscou tudo isso, não passa de um louco.
Sozinho ele morre (Isso vai da criatividade do grupo)...
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